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Archive for the ‘1’ Category

Eu sou a acrobata do banco da frente. Só você me vê. Me equilibra do lado. Na ponta dos dedos. Reflito no espelho. Algum sorriso que diz enquanto me sustento a este cinto que me amarra, me livra do mal e do acaso. Eu sou a acrobata do banco da frente. E sento ao lado. Enlaço os dedos no seu cabelo como se quisesse chegar aquele lugar comum. Vou deixar os vidros abertos-semi-abertos na esperança de que nos cruzem na velocidade. O amor, talvez. Você me vê. Respiramos o mesmo ar; estamos juntos. Explodimos com discreta naturalidade. Entre um passo e outro, espero. Nossa certeza decifra. Abismo. Repita comigo: me abismo.

 

 

 

 

( Camila Pereira)

 

 

 

 

 

Postar esta acrobacia é quase como um pedido de desculpas. Explico. Camila me mandara ainda ano passado esta beleza de versão. Mas eu, confesso, quase a perdi. Como pode? Como deixar de mostrar aqui? Finalmente, esta acrobacia redescoberta. Com um sabor melhor, acredito.

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MANUAL DE ACROBACIAS

(EM NOVE LIÇÕES)

I

acrobata do banco

de trás só

não me vê

II

contorcionista

me livra do

mal sorte ruim acaso

III

minutos finais você

embora vago

rosto triste miúdo

IV

acendedores de fogão

fósforos calmantes

naturalidade

V

vidros semi

abertos esperança

oxigenar o mundo alguém

VI

corte nos pés o

estofamento novo o

ar o respiro separados

VII

entre um passo e

outro a espera a

fila o enigma

VIII

senhas alfa

numéricas esfinge

possível abismo

IX

um abismo digo

comigo um

abismo

28.12.09

(Alexandre Barbalho)

 

 

 

 

 

As experiências com as acrobacias estão de volta. Não pude deixar de postá-las, uma vez que me foram ofertadas versões interessantíssimas, que me chegaram logo no princípio do ano, como prenúncio de um novo ciclo. Quem sabe. E para início de conversa, uma versão de Alexandre Barbalho, amigo querido e de carinho soberbo, que fatiou o poema original. Alexandre retornou ao verso, com força e gosto e, em breve, lança livro novo. Aguardem.

Para quem pegou o bonde andando, aqui nesses trilhos tortos, ou simplesmente foi chegando de manso, esses poemas que não são mais meus, mas de outrem, surgiram a partir da provocação de meu último livrinho, “Manual de Acrobacias n.1” (Editora da Casa – Florianópolis/ Editora da Vila – Fortaleza, 2009), onde 72 versões do mesmo poema se repetem tal qual um mantra (já disseram) numa ilusão da própria repetição, uma vez que cada um deles é único, particular e foi ofertado a 72 pessoas diferentes, ainda por volta de 2007, como uma experiência da sobrevivência e do afeto. Após a publicação dos poemas em livro, surgiram versões para a acrobacia das mais variadas. Perdi o controle sobre isso. Perdi o controle sobre o poema, que não é mais meu, mas de quem o reinventa. Muitas vezes, é preciso perder o controle sobre as coisas.

 

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31.12.2009

para dentro, é preciso ficar. um silêncio,

uma vibração de silêncio, contido,

atento e contido. como os peixes,

vértebra de baleia no último dia.

para dentro. observar fundo um tempo.

as latas de guloseimas, cardápio de ceia,

drink, mas olhe para onde

nunca é possível olhar.

hoje. só hoje. mesmo tarde se comova

para um silêncio, grama, carpete de

folhagem de palmeira quieta.

e chore. sabor de lágrima, sabor do brut,

sabor maçã. fique quieto. veja faíscas,

sua memória favorita, esteja no mar,

em lugar nenhum. nesse momento: aqui.

 

 

 

carlos augusto lima (vinte e sete de janeiro, lumme editor, 2008)

 

encontre aqui

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25.12.2009

 

feliz natal para você. uma

família inteira no sinal, a mãe,

um asseio de água turva, o vidro

turvo, a cabine do carro, lacre do

mundo hostil e feio e turvo. lâmpadas

chinesas, santos da cristandade e

fabricação chinesa. não entendo o que você

diz, a sua voz rápida e pobre. meu

objeto de cerco, sua voz doce

depois do banho. o banho na calçada.

o dia como um caldo denso, gigante de

presas, inferno e purgante.

a turista italiana sorri na motoneta amarela

contra algumas modulações,

como aquelas de um humor próximo

de vime e candura, ou ar desistindo

de mover, furor de suspeita

que chove em fevereiro.

 

 

carlos augusto lima  (vinte e sete de janeiro, lumme editor, 2008)

 

 

encontre aqui

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foto: c.a.l.

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eu sou uma pequena acrobata na garupa insegura da sua bicicleta e você só me vê até o final do ano de oitenta e sete, porque vai sair de casa para comprar um maço de cigarros e nunca mais voltará. vou levantar as mãos para o céu quando o dia acabar, quando sacudirmos os pés sujos de areia e cruzarmos aquele maravilhoso empreendimento na praia devastada pela maresia, pela pobreza, pelas crianças armadas e pelo fogo. você deixa as duas mãos presas o tempo todo no guidon encurvado para que ladeira abaixo desçamos de maneira desembestada, mas segura, para que alguém pouco nos veja, ninguém roube ou ameace o nosso apurado do dia quente: peixes, lambretas, camarões lustrosos e frios e um copo roído. enquanto as outras crianças vão à escola com o sapato municipal padrão você me leva ao trabalho: rede, de vez em quando um anzol e vento, imensidão, e vento. eu de cima da bicicleta, vejo o quintal do governador brilhando de água espalhada e você diz com propriedade que “aquele é o aguador molhando a grama da burguesia”. já em casa, como cozinhar o peixe se estamos sem fósforo, se os acendedores do fogão pifaram. o lugar onde moramos é Areia, nome de deserto ou de nada, à beira de uma lagoa pavimentada pelo projeto novo da prefeitura. de novo, você me amarra com cuidado em minha cadeira da garupa da sua bicicleta e já não sou mais a pequena acrobata e já não me lembro mais de nada. ou lembro: uma espera na fila do mercado, palitos, cebolas e maracujá, um calmante natural para que se exploda, sim, mas com discreta naturalidade. na fila do caixa eletrônico do supermercado que subiu sobre nosso pequeno e torto bairro, uma mulher loura se acomoda segurando seu papel: uma senha disfarçada de número de telefone, seu comportamento esfinge seu medo um enorme abismo – ninguém tem conta do banco e quando é a hora de subir a ladeira pra casa segurando compras, fósforos, cebola, você me carrega nos braços e empurra com cuidado a bicicleta branca. ainda não sei dizer: bicicleta. você me olha e tenta, você tenta os fonemas e minha língua de criança: bicicleta. repita comigo. bicicleta.

 

                                (Mariana Marques)

 

 

 

Esta é a primeira narrativa das “acrobacias”. Mas bem que poderia ser um poema. Mas o que vem a ser já não importa. Se isso ou aquilo, neste lugar ou naquele. E esta é a última acrobacia que recebi. Talvez seja a última postada aqui. Não sei o que pode acontecer. Para onde as coisas vão. Só sei que Mariana Marques (http://marianamarques.posterous.com/) me mandou este texto bonito, como são bonitos os textos outros que ela escreve. E Mariana foi a grande descoberta desse ano. Uma amizade bonita que se estica num sem fim. Que tem um conforto na fala, de saber que alguém quase fala como você e já imagina o que você irá falar e ri do que menos se espera. No futuro, vamos publicar uma gramática do nosso idioma.

 

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depois da noite iluminada, colorindo os letreiros vivos, você poderia percorrer a cidade comigo. vou completar o tanque. quarenta e quatro litros. não, acho que menos, dez a menos. este consome mais. numa parada comeremos doces caseiros ou, se quiser, restos de hóstias da fábrica imaculada, o pão e o vinho, o corpo do cristo no lanche da madrugada. o lanche da madrugada tem o sugestivo nome: messias. condimentos divinos, sucos a perder de vista. falo sério quando o assunto é partir. já preparei as malas, elas estão ali, no canto da sala, a espera. se você preferir, toma tudo na mão e vou embora de malas prontas, de avião supersônico, com meus braceletes de madri, uma dor que um dia passa e um livro de sete gramas debaixo do braço para decorar cada verso tosco, cada mimo e achado. se você quiser. mas acabo ficando e vou percorrer seis quilômetros do seu apartamento com vista para esse enorme oceano. e não preciso dizer mais nada, vou percorrer os seis quilômetros da sua estrada de tijolos amarelos. ou serão pedras portuguesas? vou embora, me disfarço com óculos e bigodes postiços em alguma alfândega até te acenar com um lenço numa praia da costa amalfitana. as pilhas estão fraquejando, como esta canção. e eu ainda tinha alguma coisa a te dizer.

 

 

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Eu sou o acrobata do banco da frente e só você me vê.

Escuto coisas e faço contorcionismo no porta-luva

Estavam lá nossos sentimentos…

fuscas amigos de rocks não são afeitos a restos de tempo

Fui muito.

Errei de movimento me guardei naquele presente

lúcido como um amigo em fim de feira

livre!

fui quase fim.

Você não vê, mas eu observo o que aparece. e

desaparece no reflexo do espelho.

(Seus gestos)

No rádio:

Detalhes tão pequenos
De nós dois
São coisas muito grandes
Prá esquecer

Vou deixar as janelas fechadas e abrir o gás do fogão

Você pensa que eu me fui.

Fui-me sim

Não

Eu vou descendo

Por todas as ruas

E vou tomar aquele

Velho navio

Eu não morri, quem morre é idiota.

Peguei foi um foguete

Aqui tava careta demais

O difícil é não cortar o cabelo quando

A barra pesa.

Você pediu pra eu tomar maracujina

Tomei heroína

Agora quem parte é você

Impávida e com a boca gelada

Eu estou livre pra cheirar

fumar

tomar

me furar

cair

tu partes em busca do nada

Eu jogo com os dados.

 

(Solon Ribeiro)

 

 

eu não sou acrobata do banco de trás porra nenhuma. não tenho mãos para o vidro. mãos amarradas não são mãos. nãos. sinto muito esse cinto frouxo que deixa minha pança mole entre o suor e o desconforto. depósito de nervo e urina. se vejo alguém lá fora, são incêndios que invento, enquanto o banco de trás é o mesmo banco da frente é o mesmo banco da praça onde eu pegava nos peitos de rose e tremia por dentro. o acrobata é esse, o que acende o passado pra não ver o mundo – presente de grego – lá fora enquanto o carro acelera lento e o caixa eletrônico do banco de trás é um monte de ferro e plástico cercado de senhas por todos os lados. ei, carlos, pára com isso, põe o pé no freio! eu já gozei muitas vezes com  palavras perversas. de pé, versos! todo poema que presta é um exército de uma guerra inevitável. grito: estou à beira do abismo do banco de trás. eu sou o não banco que carlos inventou pra virar um manual acrobata. e esse poema é quase meu, agora mais ainda. o jogo está apenas no começo. diga isso comigo. eu sou o desacrobata de gravata. o palhaço do circo do vazio. quem ri  por último ri pior. o acrobata é o motorista que dança desgovernado pelas ruas que andei. eu sou apenas um vaga-lume latino americano ao meio-dia. meia-luz que ninguém vê. pérola porca, poeira em alto mar. terra à vista! felizmente. não diga isso comigo.

 

 

(Celso Borges)

 

 

 

Dois sintomas deste maravilhoso descontrole das acrobacias. Dois poemas que mereciam estar postados no mesmo lugar. Eles se complementam. Eles se repelem. Eles são finesse e deboche. Eles provocam a si. Eles provocam a acrobacia. São o salto e a queda. Acima, Solon Ribeiro, espécie de anti-fotógrafo, artista às avessas, desafinador de coros, de contentes e caretas. Nos castelos de areia da cidade com nome de forte, Sólon é o sopro e o chute. Abaixo, Celso Borges, do mesmo naipe, da mesma esfera provocadora. Uma hora, os poemas de Celso embalaram 365 mil paixões mal curadas. Noutra, são puro punk rock. Esta é a versão punk rock da acrobacia.

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ready-made: ricardo corona

read made ricardo corona

 

 

 

Esta é a versão de Ricardo Corona (http://blogdocorona.blogspot.com) para o manual. Sua acrobacia quase silêncio, quase nenhum, um fim. Para escutar o som que não se pode ouvir, a palavra que não pode escrita. O sujeito que é pleno: ninguém.

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